quarta-feira, 2 de maio de 2012




Resenha filme "Um Método Perigoso" (A Dangerous Method)

Por Lucas Wagner

David Cronenberg é um diretor que sempre demonstrou verdadeiro fascínio pelo funcionamento da "mente" humana, em especial seus aspectos mais sinistros, investindo em uma coleção de longas claramente psicodélicos, como Mistérios e Paixões, Videodrome, Spider, eXistenZ, etc. Assim, é interessante que justamente esse cineasta (ou, também seria interessante se fosse David Lynch) invista aqui em um filme focado em Freud e Jung, grandes representantes da psicanálise, área de estudos que se dedicou a explorar âmbitos sombrios da "mente".

Mas, Um Método Perigoso infelizmente não atinge todo seu potencial. Aliás, nos momentos em que se dedica à discussões acerca da natureza humana, do estudo científico, ou dos próprios objetivos da Ciência, etc, o filme é genial, mas quando se foca no imbecil romance entre Jung (Michael Fassbender) e Sabina Sipelrein (Keira Knightley), o longa se torna uma experiência maçante.

O roteiro de Christopher Hampton consegue contruir bem os personagens de Freud (Viggo Mortensen) e Jung, mas são principalmente seus intérpretes os responsáveis por tornar os dois doutores em figuras realmente complexas e fascinantes. Viggo Mortensen (o Aragorn de O Senhor dos Anéis) transforma Freud em um cientista experiente, elegante e seguro de si. Freud aqui observa com uma calma quase complacente a rejeição da psicanálise pelo mundo, como deixa claro ao dizer que "O mundo não está pronto para a psicanálise, nem o estará daqui a 100 anos", o que torna o doutor em uma figura ainda mais respeitável, já que, com sua idade, parou de brigar contra os "inocentes" e a observar sua teoria como algo realmente válido, embora pouco compreendido (não é a toa que o filme o compare a grandes cientistas que também viram suas teorias serem fortemente contestadas). Mas o Freud de Mortensen não é perfeito. O roteiro e o ator acertam enormemente ao colocar o personagem se referindo a seus opositores como “inimigos”,  sugerindo que o vienense não está tão em paz com essas brigas ideológicas como sempre demonstra (e Mortensen acerta enormemente ao utilizar um tom de voz de claro menosprezo ao se referir aos “inimigos”).  Além disso, no momento mais intimista desse personagem,  ele nega dividir um sonho seu com Jung, já que isso o tornaria uma pessoa mais fraca, mais frágil, o tiraria do pedestal no qual todos parecem colocá-lo.

Já o excelente Michael Fassbender (o Magneto de X-Men Primeira Classe)  transforma Jung em uma figura menos segura do que Freud. Cientista de início de carreira, Jung se encontra em um dilema existencial interessante que vai formando sua identidade ao longo do filme. Além disso,  o doutor se mostra realmente fascinado pelos seus estudos e as possibilidades inexploradas da "mente" humana. Fassbender consegue interpretar Jung como uma pessoa em dúvidas existenciais, mas que ainda assim se mostra firme em suas convicções, o que o torna uma figura sempre interessante. É uma pena, no entanto, que o roteiro sabote o trabalho de Fassbender ao sugerir sua “necessidade de uma figura paterna” (pff).

O longa atinge o seu ápice nas discussões entre Freud e Jung, ou Jung e Otto Gross (Vincente Cassel, em excelente e niilista performance),  ou até mesmo entre Jung e Sabina, quando esses discutem algo váilido, e não se dedicam a seu romance. O filme, nesses momentos aborda questões complexíssimas, que levam o espectador a reflexões profundas sobre a natureza sexual do Homem (será que somos guiados apenas pelo instinto sexual ou tem algo mais?), os limites da “mente” humana, os objetivos e reais possibilidades da Ciência, o sentido da monogamia, entre vários outros assuntos. Ver esses mestres discutindo sobre questões das quais são entendidos é extremamente empolgante e fascinante, e leva o filme às alturas.

Infelizmente, o filme dedica grande parte de sua energia no desenvolvimento do maçante romance entre Jung e Sabina. Se esse romance começa interessante (principalmente ao observarmos as motivações de Jung nessa empreitada), esse vai empalidecendo tanto, se tornando tão arrastado, que no final é incompreensível o por que dos personagens dizerem que amam um ao outro.  E a personagem de Sabina não ajuda: o roteiro a constrói porcamente, transformando-a em uma figura extremamente inconstante (no mal sentido, não no sentido de ser complexa), que vai de um extremo a outro sem uma real preparação. Por mais que Keira Knightley tente dar maior dimensão a personagem, ela falha miseravelmente, por culpa do roteiro.

Além disso, é impossível ignorar a passividade da mulher de Jung. Ela demonstra ter conhecimento das escapadas do marido, mas ainda assim não está nem aí. Bom, o problema não é ela estar nem aí, mas é o péssimo desenvolvimento da personagem pelo roteiro que é o problema. Ora, no belíssimo A Época da Inocência de Martin Scosese, Winoma Ryder também interpretava uma mulher consciente de que o marido a traía, mas o roteiro e a atriz usavam isso em seu favor, ajudando a construir uma personalidade complexa e fascinante à personagem. Aqui não: sem apresentar qualquer indício dos motivos da personalidade da esposa ao se comportar assim, o roteiro a transforma em pessoa unidimensional, adquirindo o status de estúpida.

Também a conclusão do filme é uma praga. Pelo o que vemos, parece que Cronenberg e Hampton buscam dar uma conclusão em aberto, explorando mais as dúvidas e dilemas dos personagens. Não é isso o que acontece, já que a sensação que fica aqui é “e aí?”, ou seja, não entendemos e nem conseguimos imaginar o que vem pela frente. Além disso, é vergonhosa a maneira como o filme parece descartar Freud de uma hora para outra, e, no final das contas, defender apenas os argumentos de Jung, sendo que uma neutralidade no assunto da discórdia dos dois homens faria bem melhor ao filme.

Enriquecido pela criativa maneira de contar certos trechos através da leitura de cartas, Cronenberg ainda assim não faz um filme realmente admirável (embora contenha momentos admiráveis). Aliás, Um Método Perigoso poderia ser muito melhor do que. Mas, dentro da carreira de seu cineasta, e particularmente do diretor com Mortensen (com quem trabalhou nos sensacionais Marcas da Violência eSenhores do Crime), o longa deixa muito a desejar. Bom, pelo menos esse ano tem Cosmopolis para Cronenberg se redimir.

PS 1: Não sou grande fã da psicanálise, embora possa ter dado essa impressão na minha crítica. Acho apenas interessante.

PS 2: É sem sentido e demonstra inocência dos realizadores do longa ao, nos créditos finais, dizer que Jung foi o “maior psicólogo que já existiu”. Se eles tivessem realmente estudado o que deveriam para fazer o filme, não diriam isso.

3 comentários:

  1. Muito bom esse filme, assisti semana passada no cinema! Recomendo a todos.

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  2. Também gostei demais desse filme!!!

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  3. De produções cinematográficas com sucesso na disciplina de psicologia. Pessoalmente esta questão e hipnose são dois que eu adoro ver em produções deste tipo. Eu trago série O Hipnotizador, onde se pode ver a história de um homem enigamtico, revelando segredos e memórias inimagináveis foram esquecidos por esta prática. O que eu recomendo iguais

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