sábado, 5 de maio de 2012


                                                                        Paraísos Artificiais (Paraísos Artificiais/2012/Brasil)

Resenha filme Paraísos Artificias (Idem)

por Lucas Wagner

No momento em que chegou ao fim esse Paraísos Artificiais, primeiro longa de ficção do cineasta Macos Prado (do documentário Estamira), a primeira palavra que veio na cabeça foi: pretensioso. Afinal, o filme possui uma direção inegavelmente bela de Prado, mas que em momento algum ganah a relevância que pretende devido a um roteiro que não passa de regular (escrito pelo próprio Marcos Prado, juntamente com Pablo Padilha e Cristiano Gualda).

É incrível como Prado e seu diretor de fotografia, Lula Carvalho, conseguem extrair uma beleza de notável poesia das imagens do longa, de cada cena. Contendo uma parcela enorme de planos magníficos, Prado é capaz de extrair emoções profundas apartir apenas das imagens, como na cena em que vemos Nando (Luca Bianchi) e Érika (Nathália Dill) dançando em uma boate, quando o cineasta se utiliza de um plano contra-plongê belíssimo que contém as figuras dos dois no canto esquerdo da tela, enquanto o canto direito é banhado pela luz verde de néon; ou ainda a cena final, que mostra Érika encontrando o olhar de Nando durante uma festa. Ainda, é impossível não falar das cenas de sexo: filmadas com uma sutiliza, uma delicadeza tão belas que fazem o espectador sentir o afeto que os personagens tem um pelo outro; nessas cenas, Prado mantém a câmera na mão enquanto mantém esta sempre próxima dos personagens, passeando pelos corpos destes, enquanto, muitas vezes, ouvimos apenas o som de suas respirações. Além disso, é genial o que o diretor e o diretor de fotografia fazem em uma cena de sexo em particular, quando a câmera entra e sai de foco, deixando a imagem confusa, já que essa cena terá uma importância trágica no futuro de uma determinada personagem.

Aproveitando a temática do uso de drogas e raves, Prado e Carvalho criam cenas com teor psicodélico, passeando gentilmente com a câmera com seus personagens, fazendo grande uso de planos inclinados e câmera lenta, além de prestar a atenção na sutileza e leveza dos gestos dos personagens. Além disso, o cineasta faz um uso impecável da bela trilha sonora de Rodrigo Coelho e Gustavo M M, pontuando momentos mais dramáticos sem exagerar no melodrama, mas usando a trilha para tocar mais o espectador. Também vale comentar que a trilha incidental é excelente,utilizando adequadamente músicas com teor psicodélico.

Mas, se tem alguma coisa que devo reclamar da direção de Prado se deve às absurdamente extensas cenas das raves, cenas estas que, apesar de inegavelmente belas, perdem qualquer sentido narrativo devido à quantidade de tempo que o cineasta dedica a filmar seus personagens dançando. Além disso, a primeira "viagem" das personagens Érika e Lara (Lívia de Bueno) peca também pela absurda duração (mas que contém irresistível beleza).

O longa ainda conta com um elenco impecável. Luca Bianchi transforma Nando em uma figura trágica, que passa por um processo de amadurecimento doloroso ao longo do filme, devido aos acontecimentos pelos quais é obrigado a passar. César Cardadeiro confere ao irmão de Nando, "E.T", sentimentos que parecem palpáveis, além de extremamente complexos e ambíguos em relação ao irmão e à mãe. Roney Vilella confere ao seu Mark uma paz de espírito necessária ao personagem que contém as reflexões mais interessantes do filme, mesmo que induzidas por drogas. A insuportavelmente linda Lívia de Bueno confere, mesmo que à força, alguma tridimensionalidade à sua Lara (mais sobre essa personagem daqui a pouco).

Mas a inegável melhor atuação do filme fica por conta da apaixonante Nathália Dill, que interpreta Érika como uma garota sensível, que vive em busca de seu sonho, mas que passa por situações trágicas ao longo do filme que a transforma em uma mulher mais madura, mas com delicadeza que encanta qualquer um. É fascinante a maneira como Dill interpreta o arco dramático da personagem, sempre lhe conferindo a dose certa de romantismo e fascinação (é belo o momento em que "E.T" a elogia por seu trabalho como DJ e ela reaje de maneira apaixonada, fascinada). Além disso, a excelente química entre Lívia de Bueno e Nathália Dill é fundamental para que o romance entre as duas funcione da maneira correta; as atrizes são extremamente eficientes ao deixar o espectador sentir o carinho, o amor que uma nutre pela outra, o que torna esse romance um dos aspectos mais interessantes de todo o filme.

Mas, esses aspectos que discuti sobre os personagens são mais méritos dos atores do que do roteiro. Para ser sincero, os personagens são muito mal escritos, o que torna mais difícil nossa identificação com eles. Por exemplo: a trama envolvendo a morte do pai de Nando e "E.T", apesar de o roteiro tentar mostrar que ela têm importância na constituição psicológica dos personagens, é tão mal desenvolvidas que mal podemos perceber como esse evento os afeta tanto; o personagem de "E.T" é, talvez, o mais mal trabalhado, sendo que ele possui grande importância, mas que, no final, não alcançamos o nível de envolvimento com ele como o roteiro pretende; a criação de um conflito emocional entre Nando e Érika é patético e sem sentido, sendo mais para gerar um "draminha", uma tensão imbecil entre os dois do que algo de maior relevância para o desenvolvimento dos personagens; a mãe de Nando e "E.T" também não consegue a dimensão que seria necessária; entre tantos outros exemplos. Além disso, a montagem de Quito Ribeiro na verdade incomoda com sua estrutura "quebrada", saltando no tempo constantemente. Aliás, esse recurso já funcionou muito bem em filmes como O Grande Truque e 21 Gramas, mas aqui parece mais exibicionismo do que um recurso que contribui para a trama. Por fim, as reviravoltas do filme nunca chocam como pretendem, já que são extremamente previsíveis.

Apesar desses defeitos, o roteiro possui um acerto notável: não escancarar as informações para o espectador, deixando que este tire suas próprias conclusões sobre certos eventos que não são nem comentados pelos personagens. Mas esse recurso se torna apagado diante da quantidade enorme de defeitos do roteiro.

Paraísos Artificiais é um filme inegavelmente bom. Na verdade, vale e muito assistí-lo devido ao nível de suas atuações, e da poesia de suas imagens. Mas não é de jeito nenhum a obra-prima como ele acha que é. É muito pretensioso nesse aspecto, isso sim.

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