domingo, 20 de maio de 2012





Resenha filme O Corvo (The Raven)

por Lucas Wagner

Esse ano li um romance interessante chamado Dossiê Drácula, de James Reese. O romance pecava em alguns aspectos (como em seu final completamente anti-climático), mas é absurdamente eficiente ao misturar personagens reais, como o escritor Bram Stocker, ou ainda Oscar Wilde, Jack, O Estripador, etc, em uma trama completamente macabra, indo no profundo do ocultismo em diversos momentos. Além disso, Reese aproveitou bem a oportunidade de utilizar Bram Stocker e dissecar sua personalide, desenvolvendo-o como uma figura extremamente complexa e trágica, e isso fazia o livro crescer enormemente em qualidade. 

Aqui, no filme O Corvo, vemos algo parecido: acompanhamos o escritor de renome Edgar Allan Poe (interpretado por John Cusack) em uma trama de suspense, onde um assassino usa crimes presentes nos contos do autor como inspiração para seus próprios assassinatos. Uma trama interessantíssima, mas muito, muito mal aproveitada, diferente do que aconteceu no livro Dossiê Drácula.

O maior problema é inegavelmente seu roteiro, porcamente escrito por Ben Livingston e Hannah Shakespeare (que ironia!!!). É impossível não ficar impressionado com a falta de talento desses dois para escrever, já que o que vemos parece ser uma versão de rascunho de um roteiro, e não uma versão final pronta para ser filmada. Como não perceber a quantidade enorme de cratéras de lógica (furos de lógica é pouco demais)? Para citar alguns exemplos é só observar: o detetive (interpretado por Luke Evans) diz, ao estar na cena do primeiro assassinato do vilão, que já era familiar com esse assassino. Bom, isso é meio impossível, já que esse é o primeiro assassinato que ele comete. Ainda, como a polícia pode descartar com tanta facilidade a possibilidade de Edgar A. Poe ser o criminoso, sendo que isso seria até justificável, pelo o que o filme demonstra? 

Além disso, não me lembro de ter visto, em muito tempo, uma polícia tão preguiçosa na busca da resolução de um crime, além de estúpida. Ou ainda, é até triste perceber que os roteiristas se "acham" inteligentes, acreditando estar colocando discussões "fascinantes" repletas de "palavras difíceis" no filme, enquanto isso é uma mentira deslavada (qualquer um percebe isso ao ver o filme). 

Mas o pior de tudo é inegavelmente o seu vilão. Sem correr o risco de revelar algum "segredo", devo dizer que ele é muito, mas muito estúpido mesmo, além de sem graça, nada ameaçador (bom, pelos crimes que ele comete ele parece ameaçador, mas não quando o vemos em pessoa) e ultra mal desenvolvido. É quase hilário os "motivos" que ele dá para matar, sendo que esses são imbecis até mesmo para alguém que é supostamente doente mental.

Também é triste ver que os episódios de Lost e a obra-prima V de Vingança foram felizes acidentes para o cineasta James McTeigue que, desde que dirigiu os exemplos citados, comandou o horrívelNinja Assassino e agora esse O Corvo. O cineasta não consegue empolgar em momento algum, nem em perseguições, nem nas cenas de suspense, nem consegue o nível de intimidade em certas conversas entre os personagens que seria adequado (e necessário). Ele se escora no mais senso comum na arte de direção de um filme, o que já fica claro no modo como começa a filmagem de um baile, ou seja, da exata maneira como qualquer outro cineasta que já filmou um baile em um filme começa a cena (esse ano mesmo vimos isso no ruim Sherlock Holmes: Jogo das Sombras).

Quanto ao elenco, tenho que fugir um pouco da linha aqui para falar sobre John Cusack. Cusack, assim como Nicolas Cage, é um ator que, no início de sua carreira, parecia apenas um poço de sucessos e talento inesgotável, escolhendo basicamente projetos corajosos e até perigosos para um ator iniciante. Só que agora (igual a Cage) o ator raramente aparece em um filme e mostra toda a qualidade que tinha antes, quando interpretou personagens como o titereito no ótimo Quero Ser John Malkovich, o jovem adulto em crise de identidade no inesquecível Alta Fidelidade, o dramaturgo psicótico na excelente comédia de Woody Allen Tiros da Broadway (vale citar também seu perfeito desempenho como o poeta apaixonado por uma suposta prostituta em Neblinas e Sombras, um dos filmes mais fracos de Allen). Agora, O Contrato, 2012, A Ressaca, O Corvoetc, não são filmes digno do Cusack de antigamente.

Dito isso, tenho que dizer que, embora tenha certos acertos em sua performance nesse longa comentado aqui, ele peca basicamente o tempo todo. O maior problema (assim como ocorre tanto com Nicolas Cage) chama-se over-reactiing, ou seja, o exagero. Os maneirismo, tiques e a voz insuportavelmente alta que usa para compôr seu Edgar A. Poe são ridículos, e acabam transformando o grande escritor em uma perfeita (e arrogante) caricatura, sem aproveitar a possibilidade de transformá-lo em uma figura complexa. Mas, mesmo assim, é inegável que Cusack foi um mestre aqui ao conseguir demonstrar com perfeição os sentimentos ambíguos do personagem ao descobrir que seus contos estão servindo de inspiração para um assassino.

Quanto ao resto do elenco: Luke Evans é um ator com enorme potencial, mas que, assim como aconteceu em Imortais, continua sendo mal aproveitado. O veterano Brendan Gleeson consegue fazer um milagre com seu personagem, conseguindo desenvolvê-lo a ponto de conseguir criar um pequeno arco dramático para ele. Agora, de resto, tá tudo horrível, principalmente o vilão, cujo ator (que não posso dizer o nome) revela-se um verdadeiro lixo, e sua face "ameaçadora" é quase risível.

Possuindo apenas uma cena realmente marcante em todo o filme (um determinado assassinato, que vocês com certeza vão reconhecer ao ver o longa), O Corvo é um filme que eu achei tremendamente decepcionante, que busca beber na fonte dos novos Sherlock Holmes, de Guy Ritchie. Bom... bebendo dessa fonte, só podia dar errado mesmo. Mas Sherlock Holmes é levemente suportável, já que conta com o grandioso Robert Downey Jr. Aqui, nem isso temos como suporte.

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