quinta-feira, 10 de maio de 2012


                                                                        Anjos da Lei (21 Jump Street/2012/EUA)

Resenha filme "Anjos da Lei" (21 Jump Street)

Por Lucas Wagner

Vou começar de maneira bem direta: Anjos da Lei é um filme absolutamente hilário. Eu ri demais, demais, demais mesmo. Desde que assisti o excepcional Um Parto de Viagem , de Todd Phillips, em 2010, eu não ria tanto no cinema. Sinceramente, eu não esperava rir tanto como ri, chegando a doer meu rosto, minha cabeça e meu estômago e eu desejar ficar um pouquinho sem rir por não aguentar mais. 

Escrito por Michael Bacall e Jonah Hill (que também interpreta um dos protagonistas), o longa possui um conjunto de sacadas absolutamente geniais, que criam cenas impecavelmente hilárias, quase sempre dando um soco na cara do politicamente correto, levando suas piadas a extremos quase inimagináveis, como na inesquecível sequência em que vemos os protagonistas sobre o efeito de drogas (Cristo, eu começo a rir só de lembrar). Esse nível insano de humor se mantém durante todo o filme, e a boa direção de Phil Lord e Chris Miller (diretores da animação Tá Chovendo Hamburger) se torna mais do que essencial, já que esse humor nonsense poderia facilmente sair do controle e virar bagunça ao invés de engraçado.

O mais interressante do filme é como o roteiro, ao mesmo tempo que adota estereótipos típicos de filmes "badass" de ação policial (principalmente os dos anos 80), os satiriza (algo também feito pelo cineasta inglês Edgar Wright no sensacional Chumbo Grosso). Essa situação lança o filme a outro nível, como em cenas em que acompanhamos uma perseguição repleta de cortes rápidos, closes, planos fechados, etc, além de uma trilha bombástica, apenas para, no momento seguinte, os diretores tirarem a trilha e adotarem um plano mais aberto, revelando a verdadeira monotonia dessa perseguição em particular. Também, como exemplos, vale citar a cena em que o chefe da polícia vai, ameaçadoramente, dizer o endereço de um lugar, apenas para depois ficar em dúvida se falou o local certo (e mais uma vez, a "quebra" da trilha sonora tem um papel essencial), ou aquela, que é uma das minhas cenas favoritas, quando um grande número de veículos que deveriam ter explodido, não explodem, mas o mais improvável de explodir, o faz com grande violência (e a falta de lógica dessa cena contribui para ela ser ainda mais engraçada). Mas ainda vale comentar que, de vez em quando, o roteiro é genial em subverter sua própria lógica, e abraçar os estereótipos, mesmo depois de ter afirmado se tratar de estereótipos (como fica claro no personagem do capitão Dickson, interpretado de maneira hilária por Ice Cube).

Outro aspecto interessante do roteiro é a maneira como ele trata os adolescentes. Os protagonistas (interpretados por Jonah Hill e Channing Tatum) são adultos "com cara de adolescentes",  e estão infiltrados em uma escola de Ensino Médio. Se eles chegam confiantes, buscando tachar os diversos adolescentes em tipos predeterminados, o filme acerta ao deixá-los confusos com a grande confusão de novas tribos, novos estilos e novos comportamentos que encontram, mostrando como a adolescência muda de tempos em tempos. Também, é bacana que Hill e Bacall tenham colocado os traficantes como jovens ricos e preocupados com o meio ambiente e a situação político-econômica do planeta. 

Me lembrei do já clássico Debi e Lóide, dos Irmãos Farrely, pela maneira como o roteiro trata a extrema burrice de seus protagonistas. Eles não simplesmente idiotas, mas são docemente idiotas. É impossível não ficar até comovido pelo elevado déficit intelectual desses dois, o que é ajudado pelas ótimas atuações de Hill e Tatum. Mas, é uma pena que o filme não desenvolva com propriedade o relacionamento dos dois amigos. Esse relacionamento é mostrado de maneira extremamente simplista em uma série de pequenas cenas no início do longa, não permitindo que nós compreendamos essa amizade, e nem a força que ela vai ganhando durante o filme. É uma sorte que Hill e Tatum consigam estabelecer uma química tão bacana, que nos leve a observar a amizade de Schmit e Jenko pelo menos com simpatia.

Para ser sincero, eu achei os personagens do longa extremamente mal trabalhados pelo roteiro, o que é o ponto mais fraco do filme. O drama de Jenko (Channing Tatum) nunca parece funcionar, e seus dilemas (e consequentemente, seu arco dramático) parecem muito estúpidos e falsos. O arco de Schimit (Jonah Hill) parece ficar limitado (no decorrer do filme) à aprendizagem do personagem a usar corretamente uma arma, o que é ridículo, já que o roteiro não prepara essa situação corretamente e vai trabalhando o personagem em outras vias, apenas para mudar seu caminho da metade para o final do longa. Nenhum outro personagem é também devidamente trabalhado, mesmo que esses sejam curiosos e ofereçam muitas oportunidades de desenvolvimento.

Para compensar esses erros, o longa tem a sorte de contar com um elenco que está impecável. Hill interpreta Schimit com grande talento, aproveitando as oportunidades que tem para torná-lo uma figura cada vez mais tridimensional e comovente, além de até mesmo profunda (mesmo que seus dilemas não sejam totalmente originais). Tatum move mundos e fundos para dar à Jenko uma maior profundidade, falhando devido ao roteiro, mas sendo capaz de torná-lo uma pessoa extremamente carismática e docemente burra. Dave Franco dá vida ao traficante Eric, tranformando-o, na medida do possível, em uma figura carismática, mas que também passa por pesados tumultos emocionais ao longo do filme. Brie Larson cria uma Molly doce e divertida, mas não consegue fazer muito mais. Rob Riggle interpreta Sr. Walters de forma acertadamente ambígua, mas extremamente divertida e patologicamente irreverente. Ja Ice Cube... o cara simplesmente destrói! Desde que atuou no inesquecível Três Reis de David O. Russel, em 1999, o ator não fez nada relevante ou mesmo talentoso, mas aqui ele está impecável, construíndo um sujeito estereotipado, mas que admite isso, o que o torna uma das pessoas mais hilárias de todo o filme. 

O longa ainda acerta ao trazer, numa referência nostálgica à série de TV dos anos 80 que originou o filme, alguns dos astros que fizeram parte dela. Um deles eu preciso comentar, embora seja uma aparição surpresa. Então, SPOILER ALERT! NÃO CONTINUEM ESSE PARÁGRAFO SE NÃO TIVEREM VISTO O FILME OU NÃO QUISEREM "ESTRAGAR" A SURPRESA!!!......................... O astro Johnny Depp entrega, em uma pequena ponta, uma performance magnífica, impecável, que leva a gargalhadas assustadoramente histéricas, além de possuir um momento inegavelmente comovente.

Com excelente cenas de ação, dirigidas com firmeza, Anjos da Lei é um filme ótimo, hilário, criativo e absurdamente divertido. Se tivesse trabalhado melhor seus personagens, poderia se colocar ao lado de Se Beber Não Case! Um Parto de Viagem (ambos de Todd Phillips) como uma das melhores comédias hollywoodianas de muito tempo. Mas, ainda assim é ótimo.

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