sexta-feira, 6 de julho de 2012



Resenha filme "O Espetacular Homem Aranha" (The Amazing Spider Man / 2012 / EUA) dir. Marc Webb



por Lucas Wagner 

  Algo que está muito popular no Cinema moderno são os chamados reboots. Reboots são aqueles filmes que pegam uma franquia já avançada e a iniciam novamente, começando do zero. Isso ficou popular devido aos resultados das franquias Batman 007, que já estavam implodindo; a primeira com os detestáveis e patéticos Batman Eternamente Batman & Robin, e a segunda com os imbecis007 - O Mundo Não é o Bastante 007 - Um Novo Dia Para Morrer. Eram franquias acabadas, mas cujos frutos ruins foram descartados em reboots fantásticos. 007 recomeçou no extraordinário 007 - Cassino Royale, de Martin Campbell, e Batman recomeçou no inesquecível Batman Begins, do mestre Christopher Nolan. Esses novos filmes deram uma atmosfera mais sombria e violenta para as franquias, ao mesmo tempo que criavam protagonistas mais complexos e trágicos.

  Bom, mas por que eu começo essa minha resenha de O Espetacular Homem Aranha relembrando essas duas outras franquias? Porque, para 007 Batman, um reboot era algo fundamental. As séries já estavam acabadas, destruídas. Mas NÃO Homem Aranha! Há dez anos, o cineasta Sam Raime começou a franquia Homem Aranha com um ótimo primeiro filme, com um personagem complexo e bem trabalhado, enquanto criou uma obra prima com Homem Aranha 2. Com esses dois primeiros filmes, Raime conseguiu algo raro, encantando tanto crítica quanto público. Um feito notável e que tornava a estrada para essa franquia sempre mais brilhante, promentendo mais grandes filmes. Porém, Raime cagou com Homem Aranha 3. Não é um filme detestável, mas também não é bom. É medianozinho, apresentando gravíssimos problemas quanto a roteiro, direção e atuações, tornando o filme uma lambança. No entanto, Raime não encantou crítica e público novamente, e por isso mesmo, a Sony (financiadora dos longas) decidiu ignorar a trilogia de Raime e criar um reboot! Absurdamente desnecessária, estúpida e imbecil essa idéia, que claramente busca beber da fonte Batman Begins(não cito 007 por não ser sobre super heróis), ignorando uma franquia que ainda tinha salvação!

  Porém, a idéia de um reboot seria aceitável dependendo do modo como fosse trabalhada. E foi bem trabalhada?Bem... foi um pouquinho. Escrito por três excelentes roteiristas, Alvin Sargent (roteirista deHomem Aranha 2, e dos inesquecíveis Gente Como a Gente Lua de Papel), James Vanderblit (do impecável Zodíaco) e Steve Kloves (da série Harry Potter), o longa consegue desenvolver bem o personagem de Peter Parker, o que garante o filme. Ainda assim, o longa possui graves e nada ignoráveis problemas, principalmente no que se refere ao inevitável pensamento: esse filme não deveria existir.

  Sinceramente, não existe praticamente nada de novo nessa nova franquia, que desavergonhadamente REPETE os caminhos do primeiro filme de Sam Raime, algo que Christopher Nolan não fez de modo algum em Batman Begins ou Martin Campbell fez em 007 - Cassino Royale,que claramente REINVENTAVAM as respectivas franquias. Aqui, vemos Parker brigando de novo com Flash, o valentão da escola, sendo protegido pela gostosa (agora Gwen Satcy e não Mary Jane); vemos Parker decepcionando Tio Ben e, num acesso de raiva idiota, acaba sendo parcialmente responsável por sua morte (e, puta que pariu, os roteiristas repetem até mesmo o modo como o tio é morto, e até mesmo as contingências que o levam a morrer); vemos Parker tendo que abdicar de certos prazeres em prol da resposabilidade vinda com os poderes; vemos o vilão (desta vez o Lagarto) tendo alucinações esquizofrênicas entre um eu moral e um eu maligno... Basicamente não vemos NADA de novo. E quando o filme parece que vai enveredar por caminhos interessantes e desconhecidos, esse falha ao se auto-sabotar novamente, levando à mesma conclusão do primeiro filme. Se você acha que eu "estraguei surpresas" do filme com esse parágrafo, você deve pensar duas vezes, já que "estragou" essas surpresas vendo Homem Aranha de 2002.

  Mas isso fica ainda pior se observarmos que, nesse filme, encontramos falhas que não existiam no filme de Raime, como por exemplo: o seu vilão. Um bom, inteligente e bem desenvolvido vilão eleva qualquer filme, como é o Doende Verde de Willem Dafoe no primeiro, ou o Dr. Octopus no segundo. Aqui o Lagarto é um desperdício. Se ele começa apresentando-se como potencialmente complexo, ele vira uma completa palhaçada depois de um tempo. Nós nunca entendemos realmente suas motivações, seus sentimentos, suas lutas internas, o que o deixa um completo mistério (não um mistério bom como é o Coringa de Batman - O Cavaleiro das Trevas, cujo mistério apenas constribuia para desenvolver o personagem) unidimensional. Sério mesmo que eu deveria aceitar que toda sua dor psíquica vem do fato de ele ter perdido o braço? Por favor... esse é o mesmo fraco motivo do vilão de Homens de Preto 3, e se já era terrível naquele descontraído filme, aqui é ainda pior, já que supostamente devemos levar a sério essa porcaria. Os roteiristas se embaralham terrivelmente apartir do momento em que ele se torna o vilão propriamente dito e, por mais que tentem salvá-lo de diversas maneiras, não conseguem. O ator Rhys Ifans tenta torná-lo mais complexo, mas é constantemente sabotado pelo roteiro.

  Outro grave problema fica por conta do que o filme propunha. Em pôsteres e trailers, parecia que descobriríamos um grande segredo envolvendo os pais de Parker e sua própria transformação em Homem Aranha. Isso no entanto, nunca acontece, já que sua transformação é acidental, como fica evidente, e o segredo envolvendo a morte dos seus pais desempenha mínimo papel na trama. No entanto, o filme cai ainda nos créditos, propondo que "existem mais segredos envolvendo sua transformação do que imaginamos". Primeiro lugar: os roteiristas já erraram ao propor isso nos créditos, apenas para deixar um gancho para a continuação. Segundo: qualquer informação que vier será um erro, pois é impossível que a transformação de Parker não seja acidental, a não ser que o fantasma de seu pai o tenha guiado até o laboratório para que ele fosse picado pela aranha. Bitch, please! E se o segredo for que o pai o desenhou geneticamente para ser compatível com a aranha, isso também vai ser um problema, já que seria uma situação tirada do ótimo Hulk, de Ang Lee.

  O filme se torna aproveitável somente pelo desenvolvimento de Peter Parker. Andrew Garfield (do extraordinário A Rede Social de David Fincher) é um ator inegavelmente mais competente do que Tobey Maguire, que interpretou o Aranha nos filmes anteriores. Mais expressivo e talentoso, Garfield cria um Parker diferente. Ele está mais indiferente às implicâncias de seus colegas (por ser nerd e tal) do que antes, se preocupando mais consigo mesmo do que com o que os outros pensam. Não que ele não gostaria de ser popular, mas simplesmente não é a coisa com que mais se importa. Isso o torna mais complexo e interessante. Observem a cena em que uma garota parece que vai chamá-lo para sair, bem no início do filme, e prestem atenção na cuidadosa performance de Garfield: inicialmente ele nem liga direito para o que ela diz, como que não acreditando que aquilo estivesse acontecendo com ele; quando ele percebe que ela pode estar interessada nele, ele subitamente fica feliz; quando percebe que não havia interesse sexual algum, ignora o fato, como se fosse o que ele tivesse que esperar desde o início, mas ainda assim fica constrangido. Ele também se orgulha de ser nerd, e investe muito mais tempo nisso do que o Parker de antes. E também é interessante o modo como ele ressente a falta dos pais, algo demonstrado pelo seu interesse nos estudos do pai e, em uma forma doce e tocante encontrada pelo roteiro de demonstrar essa necessidade, quando ele abandona as lentes de contato e passa a usar os óculos de seu pai.

  O mais interessante porém é a forma como o filme vai trabalhando a descoberta de seus poderes. No longa de Raime, Parker não pensou primeiramente em ser um super herói, mas em usar os seus poderes para ganhar dinheiro para poder comprar um carro para impressionar Mary Jane, o que é interessante. Aqui, a leitura é diferente, e Parker parece querer usar os poderes para se divertir primeiramente, sem pensar em algo mais do que isso, o que é perfeitamente natural para um adolescente. E o modo como ele vai descobrindo-os é ainda mais interessante do que no filme de Raime. Não acostumado com sua força, ele destrói muito do que está em seu caminho; agindo por reflexo, ele desvia de gente querendo bater nele, entre outros exemplos de cenas interessantes. 

  Os caminhos para que ele se torne de fato o Homem Aranha representa o ponto mais alto do longa: depois de ser responsável pela morte do tio Ben (obviamente uma figura paterna), Parker começa uma empreitada para caçar o homem que o matou, e ainda se mostra muito violento e sombrio nisso. Aos poucos, ele vai também começando a ajudar outras pessoas, usando seus poderes para o bem, e não só por vingança. Mas, sua percepção muda completamente naquela que é a melhor cena do filme, passada em uma ponte, quando ele salva uma criança. Nesse momento que ele passa por uma mudança natural e complexa para se tornar um verdadeiro super herói. Isso, esse bom desenvolvimento do personagem, quase me leva a ignorar o fato do filme repetir o mesmo arco dramático do longa de Raime, mas não vai tão longe, já que o roteiro ainda comete alguns erros, como ao tentar forçar uma sensação de perda de uma figura paterna quando um certo personagem no terceiro ato morre (e a relação entre os dois personagens é super mal trabalhada por sinal), ou ao obervarmos como o relacionamento de Stacy e Parker é mal desenvolvido. 

  No elenco, não encontramos muita gente que merece ser mencionado, a não ser mesmo Emma Stone, que confere carisma e força à Gwen Stacy, merceendo apalusos por uma de suas últimas cenas no filme, quando demosntra maturidade e um turbilhão de sentimentos ao aceitar os caminhos que Parker deve seguir, por mais que doa na personagem (dor demonstrada belamente por Stone). Martin Sheen também confere calor humano ao tio Ben, ao passo que Sally Field está completamente apagada como tia May, algo que não ocorria nos outros filmes, quando essa era uma personagem carismática e tocante. Aqui, ela não possui importância alguma, o que é uma pena.

  A direção de Marc Webb também não é grande coisa. Depois de dirigir o belo 500 Dias Com Ela de forma criativa, cativante e extremamente empolgante, aqui o cineasta está muito no piloto automático, não fazendo nada de especial. Ele se destaca é mesmo nas cenas de ação e por focar bem e de maneira humana o desenvolvimento de Parker. Ainda ele merece mérito por conferir ao filme a melhor aparição de Stan Lee de todos os filmes da Marvel.

  Com um humor bem sucedido (algo cada vez mais raro em blockbusters, que optam por um humor apagado e sem graça), e ainda com excelentes efeitos especiais, O Espetacular Homem Aranha é um filme razoável, porém desnecessário e muito falho. Bom, pelo menos é melhor que Os Vingadores.

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