Crítica Invocação do Mal (The Conjuring / 2013 / EUA) dir. James
Wan
por
Lucas Wagner
O cineasta James Wan vem construindo uma
carreira em filmes de terror criando longas que funcionam como espécies de trem
fantasma, ou seja, um festival de horrores baseado em sustos e num arraigado
suspense. Se a sua trajetória na besta franquia Jogos Mortais se revelou insatisfatória, Wan demonstrou
amadurecimento no comando do bom Sobrenatural,
e agora se revela ainda mais promissor na direção deste Invocação do Mal, longa que diverte no abraço do exagero e das
diversas tendências propostas, ao mesmo tempo em que é uma experiência
genuinamente assustadora devido à boa construção do suspense.
Supostamente “baseado em fatos reais” (cof
cof) o roteiro de Chad e Carey Haeys acompanha os demonologistas Ed (Patrick
Wilson) e Lorraine Warren (Vera Farmiga) na investigação de fenômenos
paranormais envolvendo uma família que acaba de se mudar para uma casa antiga,
e, é claro, com uma história macabra.
Tecnicamente impecável, Invocação do Mal traz um trabalho de figurino sublime que realmente
parece se colocar no início da década de 1970, desde as roupas mais formais até
aquelas mais casuais, enquanto até mesmo os cortes de cabelo se mostram eficazes
ao representar com perfeição a época. O design
de produção também faz um tremendo trabalho ao criar ambientes que não
apenas se inserem bem na época retratada, como também evocam um clima ainda
mais sombrio e aterrorizante, algo também observável pela fotografia de John R.
Leonetti, com suas cores frias, quase sempre tendendo ao cinza ou ao azulado, mas
que ainda conferem um tom mais “clássico” ao longa. O design de som também não poderia ser deixado de fora, já que cria
uma gama de sons aterrorizantes muito bem utilizados, construindo um suspense
ainda mais eficaz pela sensacional trilha sonora de Joseph Bishara, que não apenas
tem tons mais “clássicos” de terror (como faixas que lembram gritos
estridentes), como ainda investe no mesmo expressionismo eletrônico abraçado
com tanta perfeição por Christopher Young em seu recente trabalho em A Entidade.
James Wan parece se divertir imensamente ao
passear por diversas tendências encontradas na História dos filmes de terror,
desde o meu adorado trash e, é óbvio, adentrando
para valer nos longas de exorcismo, mas não deixando de brincar com o moderno found footage (estilo de Bruxa de Blair e Atividade Paranormal) ou mesmo com o mais old school possível, com direito à espíritos encobertos por lençóis
ou fantasmas se materializando em espelhos ou janelas, e até mesmo portas que
rangem interminavelmente, celebrando a tradição dos clássicos de mansões mal
assombradas. Esse conjunto de estilos e tendências que fazem de Invocação do Mal um passeio frenético
num trem fantasma só consegue real efetividade por uma excelente e calma
construção do suspense, virtude que Wan também tinha demonstrado em Sobrenatural (que, vale dizer, também
abraçava várias tendências da História do terror). Assim, o diretor investe
numa construção cuidadosa de um clima aterrorizante através de cenas que
mostram um crescendo de desespero,
revelando aos poucos o grau da ameaça enfrentada pelos personagens, quando as
pirraças dos demônios passam de puxadas de perna para ataques violentos e
invasivos. O resultado, extremamente bem sucedido, é que o cineasta vai
tragando o espectador para a trama, deixando esse cada vez mais arrepiado, a
ponto de que, a partir de certo momento, pode usar e abusar de um exagero de
efeitos e elementos de terror que explodem como fogos de artifício no
espetacular clímax, quando o longa deixa de ser “apenas” um trem fantasma, mas
se torna uma “montanha russa fantasma” no exagero das situações enxergadas por
vários pontos de vista. Além disso, junto com Leonetti (o já citado diretor de
fotografia), Wan cria alguns quadros com certa beleza, como aquele em que vemos
uma garotinha no alto de uma escada, pontualmente iluminada por raios.
Se Sobrenatural
apresentava admirável preocupação com o desenvolvimento psicológico de seus
personagens, Invocação do Mal não se
preocupa tanto assim, mas é eficiente ao nos aproximar daquelas figuras. A
família assombrada, Perron, permite aproximação pela eficácia da dinâmica
construída pelo elenco e por Wan, que os filma sempre com a câmera na mão,
buscando mais naturalismo na retratação do cotidiano da família; em certo
momento, Wan emprega um plano sequência para mostrá-los se ajustando à nova
casa e, se tal técnica trás em si certo exibicionismo do diretor, ainda é
relativamente eficaz ao delinear a dinâmica dos envolvidos. Acaba que
conseguimos perceber os laços que os unem, na felicidade ou nas tormentas, e
por isso mesmo sofremos com eles. Isso também serve para o casal de
demonologistas, interpretados com talento habitual por Patrick Wilson e Vera
Farmiga, criando uma ótima química como casal e colegas. Farmiga confere peso dramático
à Lorraine, criando uma figura trágica e sensível, e por isso experimentamos um
pouco do desespero que Ed sente ao vê-la em perigo, desespero e dedicação esses
que são representados com verossimilhança por Wilson.
Abraçando ainda mais a década de 1970 ao usar
uma trilha incidental com músicas típicas da época, Invocação do Mal é um longa que, como o remake de Evil Dead, serve como água gelada no
deserto para aqueles que, como eu, adoram Cinema de terror e sofrem com a falta
de exemplares recentes decentes. E para que isso fique mais claro é só apreciar
a metalinguagem fascinante criada pelo último plano da projeção.
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