Análise:
Anjos da Lei 2 (22 Jump Street / 2014 / EUA) dir. Christopher Miller & Phil
Lord
por
Lucas Wagner
Ao mesmo tempo zoando e
se apropriando de estereótipos, e servindo como um excelente bromance, Anjos da Lei ainda alcançou a proeza de ser o filme mais hilário
lançado em 2012, utilizando de um humor nonsense
e sem a menor noção de ridículo para arrancar gargalhadas do público seja a
partir do absurdo do que se passa na tela ou da abissal estupidez de seus
carismáticos personagens principais. Assim, era mais do que natural não esperar
grande coisa de sua continuação, que, ao que tudo indicava, cairia no comum
erro de repetir a fórmula que funcionou no original, criando apenas uma obra
enfadonha. Realmente, Anjos da Lei 2 faz
exatamente isso. O que é mais curioso, no entanto, é que em grande parte por
isso filme funciona extraordinariamente bem.
Roteirizado por Michael
Bacall, Oren Uziel e Rodney Rothman, e novamente dirigido por Christopher
Miller e Phil Lord, o longa trás de volta os policiais Schmit (Jonah Hill) e
Jenko (Channing Tatum) mais uma vez em uma missão à paisana para revelar uma
rede de distribuição de drogas, só que agora não mais no ensino médio, e sim na
faculdade.
A trama é basicamente a
mesma do original, o que já revelaria o problema que comentei no primeiro
parágrafo. No entanto, como o original fazia com os constantes estereótipos, Anjos da Lei 2 se apropria justamente
desse seu aspecto para fins de auto-paródia, de propósito repetindo situações do
filme anterior, comentando o ridículo dessa repetição e, por vezes, levando o
espectador por caminhos enganosamente já conhecidos. Nesse último aspecto, os
realizadores evidenciam inteligência ao subverter as expectativas mais de uma
vez em uma mesma sequência, algo que fica claro naquela que envolve uma viagem alucinógena:
de cara já esperamos algo exatamente igual à fritante viagem do filme anterior
(reação induzida pelo próprio roteiro), mas o que vemos é algo bem mais banal,
até que, quando menos esperamos, os realizadores nos presenteiam com algo mais absurdo
do que jamais poderíamos esperar.
Como essa sequência bem
evidencia, Anjos da Lei 2 volta a
trazer as mesmas doses cavalares do humor perigosamente maníaco do anterior, e
novamente mergulha na profunda babaquice que é sua essência básica,
constantemente fazendo auto-referências, hora inocentes (como o escritório de
Ice Cube sobre o qual um personagem comenta a semelhança com um cubo de gelo) e
hora de auto-crítica (como os geniais créditos finais), mas sempre muito
eficazes. A apropriação dos estereótipos básicos do ambiente adotado novamente
é motivo para boas piadas, como o “show de talentos” dos universitários, a aula
de psicologia e ainda a cena da chegada da dupla principal em seu quarto. Nesse
contexto, Lord e Miller voltam a apresentar a direção amalucada do seu trabalho
anterior, com travellings que surgem
propositalmente imbecis para lembrar os clichês de filmes policiais, além dos
filtros piegasmente “estilosos”, se dando ainda o direito de brincar com as
possibilidades cartunescas oferecidas pela proposta da obra, como na sequência
de perseguição automobilística. E ainda é admirável que, mesmo sendo um filme
de humor de excessos, o longa consiga acertar em piadas mais sutis, como a que
trás vários universitários andando no campus durante o amanhecer, carregando
seus calçados e vindos de quartos alheios.
Mas Anjos da Lei 2 consegue funcionar bem
também no quesito de bromance, e aqui
vai além do original ao, mesmo mantendo clara a relação fraternal de Schmit e
Jenko, ainda assim flertar com um contexto homoafetivo, conseguindo resultados
admiráveis e bem humorados como a cena da “terapia de casal”. A eficácia e
tridimensionalidade da dupla vem muito da excelente química entre Jonah Hill e
Channing Tatum, atores que se mostram confortáveis tanto um com o outro quanto
com seus próprios personagens, especialmente Tatum, que transforma Jenko em uma
figura tão docemente estúpida que fica difícil para o espectador ao menos sentir
raiva do cara. O “drama” do bromance se
revela mais denso aqui do que era no anterior, mas nunca deixa de aparentar
sinceridade, se dando o direito ainda de brincar com uma divertida homenagem ao
clássico Noivo Neurótico, Noiva Nervosa,
de Woody Allen.
A continuação ainda se
beneficia de um elenco homogeneamente eficaz, com a maioria conseguindo extrair
o máximo que seus personagens podem oferecer. A linda Amber Stevens cria uma
Maya doce e apaixonante, enquanto Jillian Bell faz de Mercedes uma figura
sempre interessante, ambígua e estranhamente perversa. É uma beleza também que
Ice Cube ganhe mais espaço e possa
explorar mais à vontade a brutalidade do estereótipo de policial negro e durão,
enquanto a sequência que trás de volta Dave Franco e Rob Riggle soa gratuita,
mas engraçada. Infelizmente, o talentoso Peter Stormare fica apagado, assim
como Wyatt Russell, que nunca consegue fazer seu Zook uma figura mais
interessante.
E, mesmo tendo diversos
pontos positivos, e usando seus próprios problemas como virtudes, o filme por vezes erra
de verdade, como na mal trabalhada conclusão para a relação entre Schmit e Maya
ou Jenko e Zook, que são simplesmente esquecidas quando conveniente para o
roteiro. Ainda assim, Anjos da Lei 2 funciona
como o anterior, e por vezes até melhor, apresentando o mesmo humor
deliciosamente imaturo, incorreto, estúpido e irresistível.
-Meu texto do filme
anterior: Anjos da Lei
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