Análise:
Godzilla (Godzilla / 2014 / EUA) dir. Gareth Edwards
por
Lucas Wagner
Quando escrevi sobre Círculo de Fogo e RoboCop comentei que esses filmes, mesmo admiráveis em diversos
aspectos, sofriam do problema cada vez mais comum em blockbusters, que insistiam em contar suas histórias com afobação
na tentativa de manter seus espectadores interessados, sacrificando assim a
elegância e o desenvolvimento dos personagens. Em Godzilla, o diretor Gareth Edwards apresenta o admirável esforço de
ir contra essa tendência, fazendo de seu trabalho uma obra que conta sua
história com calma e que tenta humanizar mais seus personagens. No entanto, é
incrível como, mesmo tendo a idéia certa e ótimas intenções, o diretor nunca
consiga tornar seu filme realmente interessante, e o que vemos é um longa
perfeitamente enquadrado na palavra “enfado”.
Godzilla
começa
estabelecendo bem as bases de sua trama, e a visão do enorme fóssil e de todo o
mistério envolvido em torno da proteção de um segredo conspiratório fazem com
que consigamos nos interessar pelo o que está por vir. Além disso, o tempo que
o diretor leva para desenvolver os conflitos familiares entre o protagonista e
seu pai é admirável justamente por ser um esforço concreto de dar maior estofo
psicológico àquelas pessoas.
O problema aqui é que o
filme não faz jus à suas ótimas bases, e no processo descobrimos o quanto a
história da conspiração é forçada e desinteressante, assim como os personagens,
tão unidimensionais que destroem qualquer possibilidade de um elenco tão
admirável quanto o visto aqui fazer alguma coisa. Assim, somos obrigados a ver
talentos como Elizabeth Olsen (linda demais), Julliete Binoche e Sally Hawkins
presas em personagens descartáveis, enquanto o protagonista interpretado pelo
geralmente competente Aaron Taylor-Johnson é tão desinteressante quanto à trama
em si. E mesmo que Bryan Cranston e Ken Watanabe consigam conferir intensidade
e peso aos seus personagens, esse esforço hercúleo cai por terra quando seus
conflitos internos se revelam vazios.
Quanto à trama, a
impressão que fica é que o roteiro de Max Borenstein passava a impressão de uma
re-imaginação do Godzilla clássico,
com uma aparência de inteligência por conter monstros que apresentam riscos ao
forçarem uma queda de energia, o que poderia gerar uma metáfora interessante em
uma época tão dependente de tecnologias. Mas essa discussão nunca decola, e em
meio a uma estrutura repetitiva e formulaica, Gareth Edwards faz o que pode
para construir a tensão, acertando na expectativa que cria em torno do
monstro-título que, mesmo quando faz sua primeira aparição, é mostrado com
parcimônia pelo diretor, deixando o espectador ainda mais tenso na expectativa
do que está por vir. O problema é que toda a ação que decorre do monstro em si
não justifica a tensão criada, e a brochada do espectador é inevitável, criando
a sensação de que, no fim das contas, nem estávamos assistindo um filme
evidentemente sobre o Godzilla.
Ao menos o longa não
decepciona no quesito visual, e as criaturas digitais dificilmente traem sua
natureza virtual, ao passo em que as sequências de ação funcionam relativamente
bem. E embora abuse da trilha sonora de Alexandre Desplat (decepcionante frente
outros trabalhos desse mesmo compositor), Edwards comprova seu talento na composição
de alguns planos de inegável beleza estética, como quando vários paraquedistas
saltam rumo à cidade destruída. Nada aqui, no entanto, se compara a algum plano
bonito como o de Monstros (seu filme
anterior) em que trás dois alienígenas interagindo fisicamente enquanto os
protagonistas se beijam.
No fim das contas, o
enorme problema de Godzilla consiste
no fato de ser um filme insuportavelmente arrastado, tão arrastado que consegue
fazer com que percamos qualquer interesse no que estamos assistindo. Afinal,
mesmo a trama sendo ridícula, poderia ter se tornado ao menos divertida se
contada com mais agilidade e não fosse tão mesquinha na hora de explorar os
potenciais de seu monstro-título. Já o problema dos personagens vazios seria
mais difícil de contornar.
No fim, Godzilla é uma obra decepcionante,
principalmente frente à excelente campanha de marketing desenvolvida para o longa. E ao lembrar que, ano passado,
Gareth Edwards se referiu a esse projeto como o seu “filme de arte” ou “filme
de autor”, penso que o diretor tem a pobre visão de que o que classifica um trabalho
mais “artístico” é ser chato. Se for assim mesmo, as esperanças para o diretor
do ótimo Monstros diminuem
drasticamente.
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