Crítica filme Linha de Ação (Broken City /
2013 / EUA) dir. Allen Hughes
por Lucas Wagner
Linha de Ação tenta seguir direitinho o básico do que define o film noir. Seus personagens são
moralmente ambíguos, seu protagonista é um indivíduo solitário e desiludido
fortemente ligado ao passado, a atmosfera é sombria e densa, a trama começa
simples apenas para se desenrolar em algo infinitamente mais complexo e
polêmico...até mesmo o fato de o protagonista ser um detetive particular está
lá (embora não seja todo filme noir que tenha esse aspecto, mas não é
incomum encontrar). Mas não é suficiente seguir tudo certinho pelas regras para
se fazer um bom film noir: é preciso
talento, inteligência, ambição, coragem e verdadeira compreensão cinematográfica.
Os realizadores desse longa sobre o qual escrevo não demonstraram essas
características aqui. Não que Linha de
Ação seja insuportável, terrível, mas também não é um bom filme, ficando
anos-luz atrás de verdadeiros noirs como
clássicos tipo Relíquia Macabra, A Marca da Maldade e Chinatown, ou de longas mais recentes que também se aventuram no gênero, como
Sin City e o inesquecível Los Angeles – Cidade Proibida.
O roteiro de Brian Tucker conta
a história do detetive particular Billy Taggart (Mark Walhberg) que,
afogando-se em dívidas, aceita o serviço de espionar a mulher do prefeito de
Nova York, Hosteller (Russell Crowe), que acredita estar sendo traído. Mas há
muita coisa a mais por trás dessa história, como vem a descobrir Taggart.
A compreensão extremamente
juvenil do que venha a ser o noir se
manifesta a todo momento no frágil roteiro de Tucker. A começar pela própria
trama, que surge extremamente simples e mastigada para o espectador, através de
diálogos mal formulados e expositivos que realmente cansam, além de dar a falsa
impressão de que estamos vendo algo mais complexo do que realmente estamos.
Ainda, a trama surge completamente previsível, desde seus minutos iniciais,
matando assim qualquer surpresa maior que, acreditem ou não, Tucker acha que
reserva para nós; e um exemplo bem claro disso fica explicitado pelo fato de
sempre sabermos que o personagem de Crowe é o vilão da história, algo que fica
bem evidente desde sua primeira cena, por mais que, pelo desenrolar do filme,
isso deveria ser descoberto gradualmente. Poxa, até mesmo no trailer isso fica
claro! E ainda tem a questão dos personagens: além de ser um desperdício de um
puta elenco (como comentarei mais adiante), esses não são tão ambíguos quanto
Tucker acredita que são já que, na verdade, são guiados por dualidades muito
mais simples que não exigem qualquer esforço intelectual para ser desvendadas
pelo espectador, ainda mais porque muitas vezes o próprio Tucker, através dos
diálogos, já explicita essas dualidades que ainda não vão além de “ah, esse
cara parece tão justo, mas olha aí ele deixando passar algo importante”. Para
piorar, Tucker deixa vários buracos mesmo em um roteiro tão simplista e ainda investe
em alguns subtextos politicamente corretos que simplesmente não podem existir
num filme noir.
Já o diretor Allen Hughes é bem
bobão também, não enxergando possibilidades narrativas mais complexas que
poderiam ter sido bem aproveitadas. Por exemplo, Linha de Ação é um film noir passado
nos dias de hoje, então ele poderia, ao mesmo tempo em que coloca diversos
elementos dos dias de hoje (computadores, iPhones, etc), inserir aspectos que
davam um charme todo especial para as produções noir clássicas das décadas de 40/50, como os ventiladores que
circulavam quase parando ou as névoas que encobriam as ruas à noite. Até mesmo
o uso de planos mais longos beneficiariam o longa nesse sentido, mas Hughes só
usa planos rápidos e frenéticos, com uma câmera que parece nunca parar de se
movimentar. Aliás, em nenhum momento Hughes parece perceber que está filmando
um film noir, e filma Linha de Ação como um longa policial
qualquer, compensando em velocidade o que falta em conteúdo. No entanto, é
preciso dar o braço a torcer para o diretor no aspecto de que ele conseguir conferir uma energia bacana ao seu filme,
o que o torna mais suportável e pontualmente divertido; mas vale dizer que,
nesse acerto do diretor, tem muito acerto também da excepcional trilha sonora
composta por Atticus Ross (um dos responsável pelas inesquecíveis trilhas de A Rede Social e Millenium – Os Homens Que Não Amavam as Mulheres, ambos dirigidos
por David Fincher), que, com seus tons eletrônicos e sombrios, conferem um
clima e densidade bem pesados e tensos ao longa.
No que se refere ao seu
protagonista, esse só não é um completo desastre porque Mark Wahlberg é um
excelente (e subestimado, como comentei também em meu texto sobre Ted) ator, e consegue conferir peso ao
detetive Taggart, como um homem que vive dividido entre impulsos violentos e o
amor pela namorada, pela qual se segura e tenta ser um homem melhor. Porém, o
roteiro desenvolve mal demais esse personagem, sendo capaz de simplesmente
ignorar os conflitos que surgem (de forma abrupta e mal construída) entre ele e
a namorada e que obviamente eram de suma importância no desenvolvimento
psicológico dele. O caso é que, a partir de certo momento, a moça simplesmente
some de cena, e ele parece se esquecer dela, além de começar a ficar bem mais “bonzinho”
do que era antes (embora eu, particularmente, aprecie suas decisões no terceiro
ato, que quase o tornam mais complexo). Mas não é só Wahlberg que é atrapalhado
pelo roteiro, já que nenhum outro dos grandes atores aqui pode fazer algo mais
com seus papéis. Assim, Russell Crowe abraça a vilania pura de Hosteller;
Catherine Zeta-Jones fica no piloto automático como Cahtleen; Kyle Chandler
tenta transformar Paul num sujeito mais instigante, sendo barrado nessa
empreitada; Jeffrey Wright nem esforço faz como Fairbanks, e Barry Pepper é o
único, além de Wahlberg, que consegue dar uma dimensão maior ao seu respectivo
personagem.
Linha de Ação, no final das contas, é um filminho bem besta e
dispensável, embora não seja um porre. É apenas um tipo de longa burro que você
simplesmente se esquece antes mesmo de deixar a sala. E isso não acontece com
um film noir. Não quando é bom, pelo
menos.
Nota: 2,0 / 10,0
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